quinta-feira, 16 de junho de 2011

VOCÊ QUER VER?

"E chegou a Betsaida; e trouxeram-lhe um cego, e rogaram-lhe que lhe tocasse. E, tomando o cego pela mão, levou-o para fora da aldeia; e, cuspindo-lhe nos olhos, e impondo-lhe as mãos, perguntou-lhe se via alguma coisa. E, levantando ele os olhos, disse: Vejo os homens; pois os vejo como árvores que andam. Depois tornou a pôr-lhe as mãos nos olhos dele, e ele olhando firmemente ficou restabelecido, e já via ao longe e distintamente a todos. E mandou-o para a sua casa, dizendo: Não entres na aldeia. " (Marcos 8:22-26).
É comum no Novo Testamento encontrarmos a cegueira como perspectiva análoga de verdades mais profundas.
Na realidade, Jesus não só abriu os olhos concretos, reais, palpáveis e tangíveis dos cegos, como, freqüentemente, o fez em função de coisas que desejava revelar.
Vejam no evangelho de João, capítulo 9, onde Jesus curou um cego de nascença. Esta cura gera uma controvérsia, criando toda uma situação, uma celeuma em razão de sua cura súbita, e um colégio de teólogos reúne-se para decidir se aquele homem estava ou não curado. Coisas do colégio dos teólogos...
Só que o homem estava irreversivelmente curado e disposto a assumir as evidências do que acontecera com ele, fossem quais fossem as conseqüências.
 Posteriormente, ele encontrou-se com Jesus no templo, sem nem ao menos saber que fora o próprio Senhor Jesus que o curara. Jesus então pergunta se ele conhece o Filho do homem, o Messias, aquele que era a referência suprema de todas as esperanças em Israel. E o que fora cego e agora via perguntou:
"Quem é, senhor, para que nele eu creia?
Sou eu mesmo, este que contigo fala, disse Jesus."
O homem, então, curvou-se e o adorou. Jesus, aproveitando-se do ensejo, do drama, do fato que por si só trazia em seu bojo uma mensagem fortíssima, olhou para os circunstantes dizendo-lhes: eu vim a este mundo para aqueles que pensam que são clarividentes, para aqueles que se jactam das suas visões, para aqueles que se ufanam do seu poder de ver ao longe, tornem-se cegos; e vim para que aqueles que são cegos, subitamente, tenham seus olhos abertos para que vejam em plenitude e em profundidade aquilo que a vida significa.
É justo podermos afirmar e pensar que alguns desses acontecimentos ligados à cegueira nos falam, e que, no mínimo, nos lembram a respeito do fato de que pode morar na realidade humana uma cegueira muito mais profunda, pavorosa e definitiva que acometa a existência do ser humano, do que aquela que se deixa perceber através da realidade concreta da falta de visão física.
A pior cegueira é aquela que se define como a impossibilidade de enxergar o cerne, o valor, a referência suprema, a origem e o sentido da existência da vida, e de não perceber a sua última perspectiva, a sua realidade final pela qual a própria vida se vê tomada, possuída, valorizada, e empanturrada, por assim dizer, de propósito para existir.
Nesse sentido é que Jesus diz que há muita gente absolutamente cega entre nós, pessoas que não têm referência na vida, nem de onde vieram, do que fazem aqui, e de para onde vão.
Às vezes, "escatologizamos" a perspectiva do que significa estar perdido, e só pensamos naquela realidade do estar condenado. Mas estar perdido nas Escrituras é estar sem rumo, é não saber aonde ir, é não ter referência, é não ter caminho nem estrada, é não ter visão da vida, é não poder achar a si próprio com relevância na existência. É também não ter rumo, não apenas em relação à história, mas também em relação à trans-história; não apenas em relação ao tempo, mas também em relação à eternidade; não apenas em relação às coisas que podem compor o quadro das nossas opções ou dúvidas existenciais, mas, sobretudo, em relação ao quadro da nossa própria necessidade de nos embutirmos da vida como pessoas que se encontraram, que sabem quem são e que, por causa disso, sabem para onde vão.
Por esses motivos, recebemos como empréstimo um valor absoluto para a vida e pelo qual faz sentido viver, pelo qual faz sentido morrer, pelo qual faz sentido ser gente.
De acordo com os ensinos de Jesus isso é ter luz e andar nela; isso é enxergar. E notem como este andar na luz de Jesus tem a ver com o norteio, a ponto de dizer que, quem o segue, quem o acompanha, não anda nas trevas, quem anda com ele tem rumo, um rumo claro, fazendo com que a vida deixe de ser uma incógnita.
A vida pode estar freqüentemente cercada pelo absurdo, mas aquele que anda com Jesus encontra um sentido maior que o absurdo, e que lhe traz resposta a todas as perguntas.
Jesus ensina que a vida não vai acontecer na escuridão, e, sem dúvida, esta é a promessa mais radical, essencial e pujante que o Evangelho faz a qualquer ser humano. Ele oferece em Cristo este descortinar da vida, esta salvação, este deixar de estar perdido, alienado de Deus, de si mesmo e do próximo.
Extratido do Livro: A segunda unção, do Rev.Caio Fábio